Resposta à Acusação - Absolvição Sumária - Artigo 396, 396-A e 397 do CPP - Modelo de Peça Jurídica
EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUÍZ(A) DE DIREITO DA XXª VARA
CRIMINAL DA COMARCA DE CIDADE-UF
Processo nº: XXXX
XXXX, já qualificado nos autos em epígrafe,
que lhe move a Justiça Pública, por seu advogado que a esta subscreve (DOC. XX),
vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, dentro do prazo legal,
oferecer:
RESPOSTA À ACUSAÇÃO
com fulcro nos artigos 396 e 396-A, do Código de Processo Penal, consoante às razões de fato e de direito à
seguir aduzidas.
I - DOS FATOS
XXXX foi formalmente acusado pela prática do crime
de registro de nascimento inexiste, previsto no artigo 241, do Código Penal.
A acusação decorreu do fato de ter noticiado
o nascimento de "seu filho”, no 1º Cartório de Registro Civil da cidade de
XXXX. Porém, o acusado nunca foi pai e não se tem informações de alguma
gestante esperando um filho seu.
Ademais, por ser muito popular na região de XXXX,
o tabelião, de forma irresponsável, formalizou o registro da criança como se
filho de XXXX fosse, sem exigir nenhuma documentação. Apenas pediu a XXXXX que
posteriormente entregasse a papelada do nascimento no cartório.
Vale destacar à Vossa Excelência, que mais
tarde o tabelião tomou conhecimento da mentira do acusado ao encontrar um
médico da cidade durante um café. Deste modo acabou por comunicar ao delegado a
notícia falsa do nascimento.
Ato contínuo, o acusado uma semana depois foi
preso e torturado até o momento da sua confissão, em que alegou ter praticado o
crime para saciar a sua vontade de ser pai, algo impossível para ele, diante da
recusa de todas as suas namoradas.
Igualmente, o acusado foi incentivado a fazer
o registro por oito pessoas que estavam no hospital diante de um recém-nascido
muito parecido com ele.
O inquérito foi concluído e o promotor de
justiça da Comarca ofereceu a denúncia de fls. XX e XX. A denúncia foi recebida
pelo juiz, que determinou a citação do réu, nos termos do artigo 396, do Código de Processo Penal.
II - DIREITO
II.I - DAS PRELIMINARES
Preliminarmente, necessário se faz apontar
nulidade existente na exordial acusatória, vez que, flagrantemente desrespeita
o disposto no artigo 157, do Código de Processo Penal, pois foi utilizado de meio ilícito, qual
seja, a tortura, para se obter a “confissão” de prática de crime supostamente
cometido.
Resta claro, que ao utilizarem a tortura como
meio de obtenção de prova fere o previsto no artigo 5º, inciso III, da Constituição
Federal, “in verbis”:
Art. 5º Todos
são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
[...]
III - ninguém será submetido a tortura nem a
tratamento desumano ou degradante;
[...]
Evidencia-se que diante do artigo
supramencionado, que atos degradantes, desumanos, ferem direitos inerentes à pessoa
humana. Estes protegidos pela nossa lei maior, qual seja, a Constituição
Federal e pelo artigo 5º, inciso II do Pacto de San
José da Costa Rica[1] (Convenção Interamericana de Direitos Humanos).
Por esse ângulo, que foi utilizado de um meio
ilícito para obter uma declaração de pratica delituosa, sendo estas inadmissíveis no processo, conforme o
previsto no artigo 5º, inciso LVI, da Constituição
Federal.
Dessa forma, outra sorte não resta senão
declarar a nulidade de todos os procedimentos realizados até a presente fase
processual, em razão de que as provas obtidas devam ser desentranhadas do
processo, haja vista que violou normas constitucionais, internacionais e
legais.
II.II - DO MÉRITO
Observamos que na denúncia, o acusado agiu
mediante o incentivo de oito pessoas, que exacerbaram o seu desejo de ser pai,
lhe provocando a realizar o registro de uma criança.
Salienta-se que houve um dano causado à parte
íntima do indivíduo, à esfera que afeta a sua ânsia interior em ser pai. Neste
diapasão, imperioso destacar que o autor estava em um momento fora do seu
estado de consciência e normalidade, sem saber divergir sobre as atitudes
corretas e erradas.
Por certo, o acusado foi movido por um desejo
peculiar de ter alguém registrado como seu filho, de ter uma denominação e a
honra de ter um filho. A racionalidade aqui não estava presente, de modo que o
acusado foi envolvido por suas emoções e estava sob a influência das pessoas
que o influenciaram a registrar a criança.
Ora, diante do relatado o acusado
simplesmente se dirigiu ao Cartório para registro, de modo que não se preocupou
com os documentos, haja vista que não tinha esta intenção.
Ademais, vale destacar que o crime previsto
no artigo 241, do Código Penal tem como
núcleo do tipo o verbo “promover”, que se trata do fato de provocar o registro
de nascimento inexistente.
Significa assim, que o próprio acusado teria
que promover o registro da criança, o que de fato não ocorreu, dado que o
acusado apenas requereu o registro e não o fez, resta claro, portanto, que a
conduta destoa do possível crime intitulado.
Outrossim, ainda em análise ao artigo 241, do Código Penal, verifica-se que o tipo penal deixa expresso
que o registro dever ser de nascimento inexiste¸ ou seja, criança
inexistente. O que a rigor não aconteceu no caso em apreço, tendo em vista que
existiu um nascimento e, com ele, uma criança.
Por conseguinte, percebe-se a ausência de
tipicidade formal, esta gerada em razão da ausência de crime. Uma vez que, é
cediço na Doutrina Brasileira que para a configuração do crime no sistema
tripartite, faz-se necessário a presença de três requisitos, sendo eles: fato
típico, ilícito e culpável.
Em continuação, observa-se que o fato típico
tem como substratos a conduta, o resultado, o nexo causal e a tipicidade. De
modo que, comprovada a falta de subsunção do fato a norma afasta-se o crime,
visto que não estão presentes todos os elementos necessários que caracterizam o
crime em seu conceito analítico.
Nesse sentido, corrobora o jurista Luiz
Flávio Gomes:
“O fato típico
objetivo, assim, é composto da tipicidade formal + tipicidade material ou
normativa. A ausência de qualquer um desses requisitos implica
naturalmente na atipicidade do fato, que pode ser formal ou material (tudo
conforme a natureza do requisito faltante)”. [2]
Data máxima vênia, em que momento o nascimento foi
inexistente? A criança de fato nasceu, de forma que não houve na conduta do
acusado a intenção de dolo, ouve simplesmente um estado emocional exacerbado
que excedia a sua consciência estrita.
Deste modo Excelência, o ato praticado pelo
acusado é nulo de pleno direito, já que quando se dirigiu ao cartório para
registrar a criança, sob influência de oitos pessoas e a sua forte emoção e
vontade de ser pai, deixou de observar os requisitos necessários, exigidos para
que pudesse realmente dar efetividade ao registro.
Portanto, a partir do momento em que o
cartorário falhou na sua função de requerer os documentos necessários para
efetivar o registro da criança, baseando-se apenas no fato de conhecer o
suposto pai, ora acusado, acaba por transferir para si a culpa.
Resta claro então, que o acusado ao não
apresentar os documentos para registro, como o laudo médico, não perfez os
requisitos necessários para tal. Assim, utilizou-se de meio totalmente inócuo,
afinal o registro efetuado pelo acusado não é apto a produzir qualquer efeito
na órbita jurídica.
Ocorre assim, que é fato atípico, devido à
ausência da tipicidade formal. Assim como, é considerado crime impossível por
utilizar-se de um meio inócuo para atingir o resultado. Sem levar em
consideração a emoção exacerbada e a influência presente na conduta do acusado.
III - DOS PEDIDOS
Ante o exposto, pleiteia-se a absolvição
sumária do réu, pelo fato narrado não ser crime, vez que a conduta do Acusado
não se amoldou como típica, nos termos do artigo 397, inciso III, do Código de Processo Penal.
Apenas por cautela, no caso de não ser
acolhida a tese de absolvição sumária, o que não se espera, requer seja
decretada a anulação do recebimento da peça acusatória tenda em vista que foi
utilizado de meio ilícito, qual seja a tortura. Assim, pede-se que reconheça a
nulidade de todos os procedimentos até a presente fase processual.
Enfim, em não sendo acolhidos os pedidos
acima elaborados, requer sejam intimadas as testemunhas ao final arroladas,
para que sejam estas ouvidas na audiência de instrução e julgamento.
Termos em que,
Pede Deferimento.
CIDADE, XX de XXXX de
XXXX.
__________________
ADVOGADO
OAB/UF - Nº XXX
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu comentário desempenha um papel fundamental na melhoria contínua e na manutenção deste blog. Que Deus abençoe abundantemente você!