"Quando, pois,
os gentios, que não têm lei, procedem, por natureza, de conformidade com a lei,
não tendo lei, servem eles de lei para si mesmos" (Rm 2:14).
Na maioria das
sociedades, várias leis funcionam ao mesmo tempo. Pode haver leis gerais que se
aplicam a todos e leis que têm validade apenas em uma comunidade específica.
Nos tempos do Novo
Testamento, quando uma pessoa usava a palavra comum para "lei" (nomos,
em grego, lex em latim e Torah em hebraico), podia estar se referindo a
qualquer uma de uma série de leis. Muitas vezes, o único indicador quanto à lei
exata que estava em discussão era o contexto da conversa. Assim, à medida que
estudarmos neste trimestre, sempre precisaremos ter em mente o contexto
imediato, a fim de entender melhor qual lei está sendo discutida.
A lição desta semana
examina as várias leis que estavam em vigência na comunidade durante o tempo de
Cristo e da igreja primitiva. Estudaremos essas diversas leis, mas apenas no
contexto de sua utilidade para estabelecer a base para o estudo da lei que será
nosso foco principal neste trimestre: a lei moral de Deus, os Dez Mandamentos.
Lei romana
1. Leia Lucas 2:1-5.
De que forma José e Maria interagiram com o poder político? Que lições podemos
aprender com isso?
Desde o tempo da
primeira república, os romanos reconheciam a importância das leis escritas para
o governo da sociedade. Na verdade, o sistema de direito constitucional
estabelecido pelos romanos continua sendo a base dos sistemas jurídicos
encontrados em muitas sociedades democráticas atuais.
Na maior parte das
vezes, Roma permitia que os reinos vassalos mantivessem os próprios costumes,
mas todos os súditos deviam obedecer às leis do império e do senado romano.
Obviamente, isso era válido também para José e Maria.
A ênfase da lei
romana era a ordem na sociedade. Por isso, ela não abordava apenas questões de
governo, mas também estabelecia regras para o comportamento no âmbito doméstico.
Além de estipular os procedimentos para a seleção de pessoas para cargos
públicos, o direito romano também lidava com coisas como o adultério e a
relação entre senhores e escravos. Muitos dos códigos sociais são semelhantes
aos encontrados no Antigo Testamento e em outras sociedades.
Todas as tentativas
de entender a cultura em que os livros do Novo Testamento foram escritos devem
levar em conta o fato de que o Império Romano formava o cenário político para o
mundo em que viveram Jesus e a igreja primitiva. Muitas coisas que ocorreram no
Novo Testamento, desde a morte de Jesus até a prisão de Paulo, fazem muito mais
sentido quando conhecemos o contexto de seu tempo. Não é preciso ser
especialista em história romana a fim de compreender o que precisamos para a
salvação. No entanto, o conhecimento histórico é realmente útil.
Apesar do milagre da
gravidez de Maria e da atuação do Senhor nesse acontecimento, o casal ainda
obedeceu à lei, que exigia que eles deixassem seu lar, mesmo quando Maria
estava em um estágio avançado da gravidez. Não teria sido melhor simplesmente
ter ficado em casa, considerando as circunstâncias extraordinárias? O que suas
ações ensinam sobre a atitude que devemos ter para com a lei civil? Pense na
facilidade que eles teriam para justificar a desobediência.
Lei civil do
Antigo Testamento
Embora os judeus
estivessem sob o domínio romano na época de Jesus, eles receberam autoridade
sobre questões exclusivas de seus costumes e religião (At 18:15). O órgão
legislativo responsável pela administração da lei judaica era chamado Sinédrio.
Às vezes mencionado como conselho (Jo 11:47; At 5:27, ARC), o Sinédrio era
composto por 71 homens escolhidos entre os sacerdotes, anciãos e rabinos e era
presidido pelo sumo sacerdote. Servia como uma espécie de Supremo Tribunal
Federal que lidava com costumes, tradições e leis dos judeus.
A lei civil judaica
estava fundamentada nos códigos civis revelados nos cinco livros de Moisés.
Porque Moisés foi o autor dos cinco primeiros livros bíblicos, as leis são mencionadas
como a lei de Moisés. Quando Deus originalmente deu as leis a Moisés, planejou
um estado em que Ele seria o governante e o povo cumpriria Seus mandamentos. Na
época de Jesus, os judeus estavam sujeitos ao direito romano. No entanto, o
governo romano permitia que eles usassem a lei mosaica a fim de resolver
questões relacionadas com seus costumes. Nesse aspecto, o trabalho do Sinédrio
era especialmente importante.
O Novo Testamento
apresenta vários exemplos de aplicação da lei mosaica, ou de referências a ela,
em questões civis: homens judeus ainda deviam pagar o imposto de meio siclo
para o templo (Mt 17:24-27; Êx 30:13); divórcios ainda eram regidos pelas
disposições estabelecidas por Moisés (Mt 19:7; Dt 24:1-4); as pessoas ainda
seguiam a lei do levirato, em que a viúva devia se casar com o irmão de seu
marido (Mt 22:24; Dt 25:5); meninos ainda eram circuncidados no oitavo dia (Jo
7:23; Lv 12:3) e os adúlteros deviam ser punidos por apedrejamento (Jo 8:5; Dt
22:23, 24).
2. Leia Mateus
26:59-61; Hebreus 10:28; Deuteronómio 17:2-6. Que princípio importante é visto
nesses textos? O que isso nos diz a respeito dos conceitos bíblicos de justiça
e igualdade?
Leia algumas leis
civis encontradas nos primeiros livros da Bíblia. Algumas dessas leis não nos
parecem estranhas? Veja, por exemplo, Deuteronómio 21. Considerando que Deus é
o autor dessas leis, o que isso nos diz sobre a confiança que devemos ter nEle
em todas as coisas, principalmente naquilo que não compreendemos completamente?
Lei cerimonial do
Antigo Testamento
3. Leia Levítico
1:1-9; 2:14-16; 5:11-13. A que essas leis se referiam? Que importantes verdades
elas ensinavam?
Além das leis civis
de Israel, havia também o que é geralmente chamado de "lei
cerimonial". Essa lei estava centralizada no santuário e em seus rituais,
os quais foram projetados para ensinar aos filhos de Israel o plano da salvação
e apontar para eles o Messias que viria. Nas passagens bíblicas acima, por duas
vezes é mencionado que a "expiação" seria feita por intermédio dessas
cerimônias. Essas leis foram consideradas "mini-profecias" de Cristo
e Sua obra expiatória pelos pecados do povo.
"A lei
cerimonial foi dada por Jesus Cristo. Mesmo depois que ela não mais devia ser
observada, Paulo a apresentou aos judeus em sua verdadeira posição e valor,
mostrando seu lugar no plano da redenção e sua relação com a obra de Cristo. E
o grande apóstolo declara gloriosa essa lei, digna de seu divino Autor. O
serviço solene do santuário tipificava as grandiosas verdades que seriam
reveladas durante gerações sucessivas. [...] Assim, através de séculos e
séculos de trevas e apostasia, a fé se conservou viva no coração dos homens até
chegar o tempo para o advento do Messias prometido" (Ellen G. White,
Patriarcas e Profetas, p. 367).
Embora instituído
por Jesus, o sistema cerimonial foi concebido para funcionar apenas como um
tipo, um símbolo de uma realidade futura: a vinda de Jesus, Sua morte e
ministério sacerdotal. Uma vez que Ele completasse Sua obra na Terra, esse
antigo sistema, com seus sacrifícios, rituais e festas já não seria necessário
(Hb 9:9-12). Embora já não observemos a lei cerimonial, ao estudá-la, podemos
reunir ideias sobre o plano da salvação.
No centro do serviço
do santuário estava o sacrifício de animais, que apontava para a morte de
Jesus. Por que nossa salvação depende da Sua morte em nosso favor? O que isso
diz sobre o
custo do pecado?
Lei rabínica
Além das leis
mosaicas, os judeus da época de Jesus também estavam familiarizados com a lei
dos rabinos. Estes eram o braço acadêmico dos fariseus, e assumiam a
responsabilidade de garantir que a lei mosaica permanecesse relevante para o
povo. Os rabinos contaram 613 leis nos cinco livros de Moisés (incluindo 39
relacionadas ao sábado). Eles usavam essas leis como base para sua legislação e
complementavam as leis escritas com uma lei oral que consistia em
interpretações dos principais rabinos.
A lei oral é
conhecida como halakha, que significa "caminhar". Os rabinos
consideravam que, se o povo seguisse suas numerosas halakoth (plural de
halakha), eles iriam andar no caminho das 613 leis principais. Embora tenham
surgido como lei oral, as halakoth rabínicas foram organizadas e registradas em
forma de livro. Algumas das interpretações da época de Jesus sobreviveram em
comentários conhecidos como Midrash, enquanto outras estão registradas em uma
coleção de leis chamada Mishná. Muitos judeus religiosos ao longo dos séculos,
e até hoje, procuram cumprir rigorosamente essas leis.
4. Leia Lucas
14:1-6; João 9. Embora Jesus tenha sido acusado de transgredir o sábado com
Seus milagres de cura, será que o Antigo Testamento considerava pecado curar no
dia de sábado? Como podemos evitar os erros dos judeus enquanto procuramos
"andar fielmente no caminho"?
Embora seja fácil,
da nossa perspectiva, ridicularizar muitas dessas leis orais, especialmente
porque elas foram usadas contra Jesus, a falha estava mais na atitude dos
líderes, não nas leis. Ainda que fosse cumprida de maneira legalista, as
halakoth foram feitas para ser muito espirituais, infundindo um elemento
espiritual nas atividades mais rotineiras, dando-lhes um significado religioso.
Como podemos dar um
significado religioso às mais corriqueiras atividades de nossa vida?
A lei moral
Por mais que o direito
romano, a lei mosaica e a lei rabínica impactassem a vida dos judeus que
viveram em Israel no primeiro século, muitas pessoas que seguiam a religião de
Israel viviam fora da Palestina e além das fronteiras do Império Romano. Assim,
muitas dessas leis não teriam desempenhado um papel importante em sua vida.
No entanto, todo
seguidor do Deus de Israel teria sido fiel aos Dez Mandamentos. "Os Dez
Mandamentos proviam a estrutura moral que sustentava Israel. A metáfora que a
Bíblia usa para expressar essa relação é aliança. Embora a metáfora venha da
esfera do direito internacional, é errado compreender os mandamentos apenas
como um resumo das obrigações de Israel para com Deus. [...] A obediência de
Israel aos mandamentos era mais uma resposta ao amor do que uma questão de
submissão à vontade divina" (Leslie J. Hoppe, "Ten Commandments"
[Dez Mandamentos], Eerdmans Dictionary of the Bible [Dicionário da Bíblia];
Grand Rapids, MI: Eerdmans, 2000, p. 1.285).
Os Dez Mandamentos
superavam qualquer sistema jurídico conhecido por judeus no primeiro século.
Mesmo os fariseus, que tinham memorizado meticulosamente as 613 leis mosaicas,
reconheciam a importância dos Dez Mandamentos. A divisão da Mishná chamada
Tamid (5:1) contém um mandamento rabínico de recitar os Dez Mandamentos
diariamente. Acreditava-se que todas as outras leis estavam contidas nos Dez
Mandamentos. Na verdade, o filósofo judeu Filo, contemporâneo de Jesus,
escreveu um livro sobre a posição central que os Dez Mandamentos tinham entre
todas as leis bíblicas.
5. Leia Mateus
19:16-19; Romanos 13:8-10; Tiago 2:8-12. O que esses versos dizem sobre o papel
dos Dez Mandamentos na vida dos seguidores de Cristo?
À semelhança de seus
irmãos judeus, os escritores do Novo Testamento reconheciam o propósito dos Dez
Mandamentos para o povo de Deus. Algumas das lições deste trimestre falarão
sobre a maneira pela qual Cristo interagiu com outros sistemas de leis do Seu
tempo. No entanto, a ênfase principal será Sua relação com os Dez Mandamentos,
conhecidos como a "lei moral".
Leia:
"Se Adão não
tivesse transgredido a lei de Deus, nunca teria sido instituída a lei
cerimonial. O evangelho das boas-novas foi primeiramente dado a Adão na
declaração que lhe foi feita, de que a semente da mulher feriria a cabeça da
serpente; e foi transmitido através de sucessivas gerações a Noé, Abraão e
Moisés. O conhecimento da lei de Deus e do plano da salvação foi comunicado a
Adão e Eva pelo próprio Cristo. Entesouraram cuidadosamente a importante lição,
transmitindo-a verbalmente aos filhos e aos filhos dos filhos. Assim foi
preservado o conhecimento da lei de Deus" (Ellen G. White, Mensagens
Escolhidas, v. 1, p. 230).
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